Varredura Z

A técnica de varredura Z (em inglês z-scan) é uma técnica simples e sensível, amplamente utilizada para a medida do sinal e da magnitude das propriedades ópticas não lineares de materiais. Foi proposta em 1989[1] por Mansoor Sheik-bahae, Ali A. Said, e Eric W. Van Stryland no Centro de Pesquisa e Educação em Óptica e Lasers (CREOL), Universidade da Flórida Central.

Em particular, é utilizada para a caracterização do índice de refração não linear n 2 {\displaystyle n_{2}} (efeito kerr óptico) e o coeficiente de absorção não linear Δ α {\displaystyle \Delta \alpha } , por meio das configurações fechada e aberta, respectivamente. Os fenômenos típicos de absorção não linear envolvem, por exemplo, a absorção de dois fótons e a saturação de absorção. Uma vez que a absorção não linear pode interferir na medida do índice de refração não linear, a configuração aberta é geralmente usada em conjunto com a configuração fechada, a fim de calcular o valor correto de n 2 {\displaystyle n_{2}} .[2]

A técnica consiste em deslocar uma amostra fina ao longo da direção de propagação de um feixe laser, focalizado e com perfil transversal gaussiano, enquanto a radiação transmitida por esta é detectada no regime de campo distante. A amostra é movimentada em torno da região focal, que define a posição z = 0 {\displaystyle z=0} . À medida que que amostra é aproximada do ponto focal a intensidade da radiação aumenta, pois há redução da área iluminada. Desse modo, fenômenos ópticos não lineares são estimulados e, portanto, o índice de refração e o coeficiente de absorção da amostra são descritos, respectivamente, por:[3]

n = n 0 + n 2 I {\displaystyle n=n_{0}+n_{2}I\,}
α = α 0 + Δ α I {\displaystyle \alpha =\alpha _{0}+\Delta \alpha I\,}

em que n 0 {\displaystyle n_{0}} corresponde ao índice de refração linear e α 0 {\displaystyle \alpha _{0}} ao coeficiente de absorção linear. Como a amostra experimenta o valor máximo de intensidade no ponto focal da lente, propriedades ópticas não lineares são estimuladas em torno dessa região.

O nome varreduza Z se deve ao fato da amostra ser deslocada ao longo da direção de propagação do feixe. Essa direção é usualmente definida como eixo z ^ {\displaystyle {\hat {z}}} pela descrição matemática usual.

Princípios experimentais

Um feixe laser pulsado e com perfil transversal gaussiano é focalizado, definindo no foco a posição z = 0 {\displaystyle z=0} . Uma amostra é então deslocada ao longo do eixo de propagação, em torno da região focal. À cada posição da amostra, a luz transmitida por esta é direcionada a um detector e um programa de aquisição registra a intensidade luminosa em função da posição z {\displaystyle z} desta. A transmitância em cada posição é então normalizada por um valor de referência. Este pode ser tanto o sinal proveniente de um detector de referência, obtido adicionando um divisor de feixe anterior à lente de colimação, de forma que esse sinal é independente da posição da amostra. Outra possibilidade é utilizar o valor da transmitância em uma posição distante do foco, onde ocorrem apenas efeitos lineares. Em ambos os casos, variações do valor da transmitância normalizada T N {\displaystyle T_{N}} com relação à unidade são devidas apenas aos fenômenos não lineares.

Configuração fechada

Na configuração fechada, uma íris é posicionada em frente ao detector de modo que apenas uma fração da luz transmitida é captada por esse. Essa configuração experimental é sensível a mudanças na refração da amostra, permitindo a determinação do índice de refração não linear n 2 {\displaystyle n_{2}} .

A técnica de varredura-Z na configuração fechada é baseada no fenômeno de autofocalização, isso é, quando um feixe com perfil gaussiano incide sobre uma amostra com n 2 0 {\displaystyle n_{2}\neq 0} há a formação de um gradiente transversal de índice de refração. Assim, a amostra se comporta como uma lente convergente se n 2 > 0 {\displaystyle n_{2}>0} ou divergente caso n 2 < 0 {\displaystyle n_{2}<0} .

Supondo que um material com n 2 > 0 {\displaystyle n_{2}>0} seja posicionado em z < 0 {\displaystyle z<0} , longe da região focal, não ocorrem fenômenos não lineares, uma vez que a intensidade luminosa é baixa. Desse modo, a transmitância normalizada é unitária. Quando a amostra se aproxima do foco ainda em z < 0 {\displaystyle z<0} , o aumento da intensidade resulta no efeito de autofocalização. Como a amostra se comporta como uma lente convergente, o feixe é focalizado em uma posição anterior a que estava quando existiam apenas fenômenos lineares, resultando em um feixe com maior área na região do detector e em uma diminuição na intensidade transmitida. Por outro lado, para a amostra na região z > 0 {\displaystyle z>0} , o feixe é focalizado em uma posição posterior, diminuindo sua área sobre a íris e, consequentemente, aumentando a transmitância. Em z = 0 {\displaystyle z=0} , há um efeito análogo ao de posicionar uma lente delgada na região de foco de outra lente. Para z > 0 {\displaystyle z>0} , distante do foco, os fenômenos não lineares deixam de ocorrer e, novamente, T N = 1 {\displaystyle T_{N}=1} .

Caso a amostra utilizada possua não linearidade negativa, os fenômenos descritos terão efeitos contrários, aumentando a transmitância para z {\displaystyle z} negativo e diminuindo para z {\displaystyle z} positivo.

A transmitância medida pelo detector em função da posição da amostra depende, portanto, da magnitude e do sinal de n 2 {\displaystyle n_{2}} .

Para uma amostra puramente refrativa, ou seja, que não apresenta absorção não linear, a relação entre a transmitância normalizada T N {\displaystyle T_{N}} e a posição z {\displaystyle z} da amostra é dada pelo modelo de Sheik-bahae:[1][4]

T N ( z ) = 1 + 8 π λ n 2 I 0 l e f ( z / z 0 ) [ 1 + ( z / z 0 ) 2 ] [ 9 + ( z / z 0 ) 2 ] , {\displaystyle T_{N}(z)=1+{\frac {8\pi }{\lambda }}{\frac {n_{2}I_{0}l_{ef}(z/z_{0})}{\left[1+(z/z_{0})^{2}\right]\left[9+(z/z_{0})^{2}\right]}},}

em que λ {\displaystyle \lambda } é o comprimento de onda da radiação incidente, I 0 {\displaystyle I_{0}} corresponde à intensidade do laser no foco e no eixo, l e f = [ 1 exp ( α 0 l ) ] / α 0 {\displaystyle l_{ef}=\left[1-\exp {(\alpha _{0}l)}\right]/\alpha _{0}} é a espessura efetiva da amostra e z 0 {\displaystyle z_{0}} é o comprimento de Rayleigh.

Configuração aberta

O arranjo experimental referente à configuração aberta é semelhante àquele descrito para a configuração fechada. Contudo, nesse caso a íris é removida e uma segunda lente convergente é posicionada entre a amostra e o detector. Essa configuração é sensível a alterações na absorção da radiação, de forma que o coeficiente de absorção de não linear Δ α {\displaystyle \Delta \alpha } pode ser determinado.

Apenas quando a amostra está próxima do foco há densidade de fótons suficientemente grande para estimular efeitos não lineares. Quando o fenômeno de absorção de dois fótons é o mecanismo responsável pela alteração na absorção, o resultado típico de experimentos de varredura-Z na configuração aberta corresponde a um vale em torno da posição z = 0 {\displaystyle z=0} . Por outro lado, caso o mecanismo seja a saturação de absorção, a curva corresponde a um pico em torno da posição focal.

Na configuração aberta, a relação entre a transmitância normalizada T N {\displaystyle T_{N}} e a posição z {\displaystyle z} da amostra dada pelo modelo de Sheik-bahae[1][4] é:

T N ( z ) = 1 π q 0 ( z , 0 ) ln [ 1 + q 0 ( z , 0 ) exp ( τ 2 ) ] d τ , {\displaystyle T_{N}(z)={\frac {1}{{\sqrt {\pi }}q_{0}(z,0)}}\int _{-\infty }^{\infty }\ln \left[1+q_{0}(z,0)\exp \left(-\tau ^{2}\right)\right]\,d\tau ,}

em que q 0 ( z , 0 ) = Δ α I 0 l e f 1 + ( z / z 0 ) 2 {\displaystyle q_{0}(z,0)={\frac {\Delta \alpha I_{0}l_{ef}}{1+\left(z/z_{0}\right)^{2}}}} , I 0 {\displaystyle I_{0}} corresponde à intensidade no foco e no eixo, l e f = [ 1 exp ( α 0 l ) ] / α 0 {\displaystyle l_{ef}=\left[1-\exp {(\alpha _{0}l)}\right]/\alpha _{0}} é a espessura efetiva da amostra e z 0 {\displaystyle z_{0}} é o comprimento de Rayleigh.

Fundamentos teóricos

A dependência espacial da intensidade I {\displaystyle I} de um feixe com perfil transversal gaussiano é dada por:

I ( r , z ) = I 0 ( w 0 w ( z ) ) 2 exp ( 2 r 2 w 2 ( z ) ) {\displaystyle I(r,z)=I_{0}\left({\frac {w_{0}}{w(z)}}\right)^{2}\exp \!\left({\frac {-2r^{2}}{w^{2}(z)}}\right)\,}

em que r {\displaystyle r} é a distância radial ao eixo central do feixe, I 0 {\displaystyle I_{0}} corresponde à intensidade no foco e no eixo, w ( z ) {\displaystyle w(z)} ao raio do feixe na posição z {\displaystyle z} e w 0 = w ( z = 0 ) {\displaystyle w_{0}=w(z=0)} é a cintura do feixe. O raio do feixe em função da posição z {\displaystyle z} é:

w ( z ) = w 0 1 + ( z z 0 ) 2 {\displaystyle w(z)=w_{0}{\sqrt {1+\left({\frac {z}{z_{0}}}\right)^{2}}}\,}

em que z 0 {\displaystyle z_{0}} é o comprimento de Rayleigh.

Referências

  1. a b c Sheik-bahae, M.; Said, A. A.; Van Stryland, E. W. (1989). «High-sensitivity, single-beam n2 measurements». Optics Letters. 14 (17): 955 - 957. ISSN 0146-9592. doi:10.1364/OL.14.000955 
  2. Yin, M.; Li, H.P.; Tang, S.H.; Ji, W. (2000). «Determination of nonlinear absorption and refraction by single Z-scan method». Applied Physics B: Lasers and Optics. 70 (4): 587–591. ISSN 0946-2171. doi:10.1007/s003400050866. Consultado em 25 de agosto de 2014 
  3. Boyd, Robert (2008). Nonlinear Optics 3rd ed. [S.l.]: Academic Press. ISBN 978-0123694706 
  4. a b Sheik-Bahae, Mansoor; Said, Ali A.; Wei, T.-H.; Hagan, David J.; Van Stryland, Eric W. (1990). «Sensitive measurement of optical nonlinearities using a single beam». IEEE Journal of Quantum Electronics. 26 (4): 760–769. doi:10.1109/3.53394